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francisco luís fontinha

Nunca vi o mar, A minha mãe sonâmbula nas noites de cacimbo desenhava o mar no teto da alcofa, um círculo com olhos verdes e sorrisos e cheiros que aprendi a distinguir antes de adormecer, e eu, e eu... francisco luís fontinha.

francisco luís fontinha

Nunca vi o mar, A minha mãe sonâmbula nas noites de cacimbo desenhava o mar no teto da alcofa, um círculo com olhos verdes e sorrisos e cheiros que aprendi a distinguir antes de adormecer, e eu, e eu... francisco luís fontinha.


30.04.13

foto: A&M ART and Photos

 

Não tenham pressa da minha presença, talvez um dia, talvez, regresse, talvez, um dia, decida levantar voo e andar, e andar, até encontrar o planalto das rochas encarnadas, não, pressa não, porque um dia, eu, regressarei dos finos cortinados de espuma,

uma camisa furtada do estendal da vizinha Amélia, as calças, são do cigano Mário Zé, especialista em auto-rádios e carros de pequena cilindrada, e eu, desiludida, contigo, comigo, connosco, e os velhos sapatos pertenciam ao primo Justino,

A cabeça balança entre as mãos frígidas dos lilases argumentos sem palavras de amor, palavras de dor, ou

não às palavras,

Havia dentro de nós circos, roulotes e malabaristas, o meu pai era trapezista e a minha mãe, entre os intervalos de bailarina esfomeada, tinha um pequeno número de ilusionismo, e

nunca me esqueci do sucesso número dela, quando me colocava dentro de uma caixa de cartão, batia as palmas, e eu

Desapareceste da minha vida naquela fatídica manhã de Sábado junto ao Tejo acabado de assassinar-se, os motivos, ainda hoje desconhecidos, morte incógnita, mas presente entre nós, e tu

Eu desaparecia, ela abria cuidadosamente a caixa de cartão, remexia, remexia, virava de um lado, mostrava o outro, e o rapaz

Desapareceu de casa de seus pais, digo, desapareceu da roulote onde vivia com os seus pais um rapaz do sexo masculino, cerca de seis anos de idade, cabelo castanho e olhos verdes, vestia calções e uma camisola antiquada, calçava umas velhas sandálias de couro, e levava na mão esquerda, sim, penso que sim, espere, não sei, quase que tenho a certeza, e levava não mão esquerda um cavalo

cavalo?

Perdão, um caderno de capa ondulada e escuro, sem imagens, apenas com palavras semeadas numa tarde de vento quando os bancos de jardim ainda tinham ripas de madeira, não podres, ripas de madeira a sério, e já agora pergunto-me – Onde raio fui eu buscar o cavalo? - há cada coisa, em cada hora, a cada momento, numa rua deserta da cidade, uma feira de velharias, uma boina de um soldado da EX-URSS, compro, não compro, pensei

deve ter piolhos,

Não comprei, depois, mostraram-me os cachimbos, compro, não compro, não comprei

lembrei-me da quantidade de saliva – Do tipo... um milímetro por segundo! - desisti

Pensei,

Vou comprar um livro,

que livro – Que tipo de livro deseja? - respondi, talvez de AL Berto

Ela, Como? Quem?

pensei, que raio, nem ela conhece o AL Berto...

Desisto, desisto, e desisti, hoje sou feliz, finalmente apareci dentro de uma das caixas de cartão que a minha mãe fez um dia, num lindo espectáculo, desaparecer, cresci algures, e o meu pai hoje não trapezista, reformou-se e vive desafogadamente com uma linda reforma da Caixa, não, não aquela de cartão onde a minha mãe me fez desaparecer, é a outra caixa, e a minha mãe, hoje, abre a janela da roulote e conta o número de comboios machos que passam em frente à árvore dos telhados bolorentos, porque os comboios fêmeas, ela, deixa-as seguir, sossegadamente, como se fossem o vento numa noite de cavalos...

cavalos?

Quais cavalos, menino?

Uma tarde, numa linda tarde, estava eu com uma das mãos prisioneira de uma das barras de ferro do portão de entrada, o quintal era enorme, tinha mangueiras, e ao fundo, nas traseiras da casa, havia um galinheiro, tínhamos galinhas, patos e pombas, às vezes, passeava-se por lá um velho triciclo, outras, escondia-se debaixo da sombra, e, e nessa linda tarde, repentinamente e no intervalo entre o depois do lanche e a chegada do meu avô, vi passar em frente a mim...

Como não sabe quem foi o poeta AL Berto?

Uma menina vestida de branco, montando um lindíssimo cavalo branco,

Tem ao menos alguma coisa do Pacheco?

ele, o cavalo olhou-me, e desde então, pertence-me, e anda dentro de mim até que um dia

Qual Pacheco? O Luiz, minha senhora, o Luiz,

que não, não sabe dessas coisas, ora agora..., um cavalo

Qual cavalo, menino?

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha


29.04.13

foto: A&M ART and Photos

 

 

Percebia-se, pelas tuas nádegas de algodão, que a noite entranhava-lhes como pássaros na algibeira de um mendigo, dormiam em caixas de papelão, pobrezinhos, escreviam sobre as ombreiras do ensonado dia, “caixas simples cartão”, porque era chique, porque estava na moda, porque ao fundo da rua sentia-se o ressonar da lua, e a transpiração de saliva dos pulmões de aveia, não tínheis pequeno-almoço, preçário, cardápio ou subsídio diário, uma sandes de pouca coisa, ou quase anda, chorava no interior de duas finas fatias de pão, sem saberdes que lá fora, ao longe, de uma escada em madeira, desciam os anjos e os gemidos silêncios da verdura que cobrem os campos da aldeia, como pedras, lajes de granito, lápides em cimento, e aos poucos, de poucos, apagariam-se-lhes todas as letras da literatura pura e nua, entre desenhos e sílabas, entre candeeiros de vidro e lâmpadas de papel,

gostava muito de ti,

Desenhava-te no espelho da montra do senhor Ernesto, em traços finos, colocava-te sobre os olhos um fio doirado de cabelo, dava-te lábios com sabor a chocolate, tinha-te na boca como oxigénio essencial à minha respiração, ouviam-se coisas mortas, objectos despedidos, canas de pesca, carretos e chumbeiras, bóias, anzóis e as pesadíssimas botas de borracha, e mesmo assim, ouvia-te

gosto de ti,

Percebia-se, pela ausência de cubículos para todos, que nem nus somos iguais, uns, mais diferentes do que outros, e havia sempre um que ficava sem onde pernoitar na fria noite de Janeiro, aqui, porque lá, bastava-lhe cobrir-se com um ramo de palmeira, havia um largo, eles abraçaram-se longamente e esqueceram-se que eram uma rocha à beira do rio, do largo, mais acima, uma duas palmeiras adormeciam já devido às distantes horas que estavam previstas para regressarmos, nem um único som, uma única palavra, nada

só e só o beijo da despedida,

Só e só, e não muito mais, como anos depois, as palmeiras continuam adormecidas, mais velhas, claro, mas ainda estão vivas, não há muito tempo, estive com elas, almoçamos juntos, e recordamos noites, noites, noites que eu mesmo já tinha esquecido, falaram-me de uns pássaros que poisavam nos nossos ombros, e também de umas flores, se não estou enganado, isto é, se não fui enganado por elas, de umas flores amarelas, ou cinzentas, ou

gostava muito de ti,

Ou incolores, como os beijos, ou indolores, como as ondas do Oceano que ficávamos a olhar até desaparecerem sobre os telhados de Lisboa, o cheiro do rio entrava dentro dos nossos corpos escondidos em caixas de papelão,

“caixas simples cartão”

E hoje, quando estou no largo, debaixo das velhas palmeiras, ao longe a lua em movimentos descoordenados, sem luz de candeeiro, dos minguados olhos que o sol deixou sobre a mesa-de-cabeceira, e derramadas sombras construindo imagens na esplanada dos arbustos com braços negros e pernas encarnadas, perguntava-te pelas cartas perfumadas, e tu

queimei-as, porquê?

Apenas pelo perfume, porque pelas palavras perdia o sentido das letras, deixei de amar palavras, frases, livros, cadernos, poemas, “... e toda a merda comestível...”, só e só pelo perfume, só e só quando desce a noite e de barriga para o ar, eu deitado, olho o tecto, vejo estrelas azuis, estrelas pretas, estrelas... como chuva friorenta em Primavera, e só e só, tenho saudades do perfume

das amoreiras em flor, das mimosas, de deitar-me no chão e fazer desenhos imaginários no céu nocturno da cidade, a cidade proibida, com calçadas, ruas, ponte e pontões, “putas” e “cabrões”, a cidade dos barcos com ferrugem, a cidade das casas comestíveis depois da sobremesa, e homens com alegria, e homens em bebedeira em fila Indiana para ter acesso a uma merda de uma caixa de papelão,

“uma linda caixa em fino cartão, três assoalhadas, uma varanda para o Tejo, casa de banho completa, e ascensor, e muitas cartas, cartas de amor, todas elas, perfumadas...”

E eu dava-lhe a mão, e passávamos a noite dentro do ascensor, em subidas, em descidas, e às vezes

parávamos, e esquecíamos-nos que algum dia estivemos debaixo de duas velhas palmeiras a construir o beijo mais literário de sempre, o beijo poético

E às vezes,

o beijo fatídico,

E às vezes adormecias nos meus braços...

 

(ficção não revisto)

“Alguém vai dizer: ficção o caralho...!”

@Francisco Luís Fontinha

foto: A&M ART and Photos


28.04.13

foto: A&M ART and Photos

 

(ao Rei dos Sonhos)



Sabia-te quando terminavas nos sonhos e caminhavas no corredor da saudade, ouvia-te dançar sobre o mosaico porcelana da piscina em forma de rua, perdida, tu, corrias em direcção às escadas de acesso da rua dos pequenos beijos de porcelana, dormias entretanto, profundamente, pensava eu, quando olhava nos teu olhos cerrados as imagens reflectidas de uma louca e antiga máquina de slides, o picotado desenhado numa fina película de plástico retirada a um saco incolor de supermercado, finíssima, ela não maior do que um carro de linhas, que servia de carreto que com uma manivela de arame fazia rodar as imagens em frente de uma lâmpada, dormias, dormias, ainda dormes, e eu, permanentemente às voltas com a manivela a inventar imagens picotadas numa tira de plástico com uma agulha esquecida juntamente com o dedal da minha mãe,

a inventar imagens desde 1976,

Fundiam-se-lhe lâmpadas que só posteriormente percebíamos a escuridão das equações diferenciais que tínhamos para resolver, elas, como eles, poisavam sobre a mesa da sala de jantar, ficavam lá, perdidas, fazíamos-las esquecidas, e às vezes, poucas, só com a ajuda de drageias, elas, as equações (macho e fêmea) acordavam do sono incrédulo que Deus nunca acreditou e aos berros

preguiçosos,

preguiçosas,

Sabia-te quando terminavas, acordavas, abrias as janelas do teu corpo, e deixavas entrar a luz que o espelho do guarda-fato absorvia da velha máquina de slides, havia imagens dentro de ti, e só quando te acariciava os seios, e só quando te beijava os lábios de sonâmbulo cravo vermelho, e só

que desenhos mais esquisitos, como corredores, pássaros, migalhas de aço e sobras de vento,

E só quando deitava a minha cabeça nas tuas coxas, sentia eu, sentias tu, as imagens todas, as de ontem, as de antes de ontem, e as imagens de infância, saíam do espelho do guarda-fato, sentavam-se um pouco sobre a mesa-de-cabeceira, apenas para nos contemplarem, e só depois, começavam a entrar em ti, e no fim, eu entrava também, e tinha como missão, encerrar a porta, hermeticamente, e dentro de ti, saltava, brincava, dormia, como tu

a inventar imagens desde 1976,

Como tu, dentro de uma piscina, caminhando a passos apressados como se a rua estive quase a fechar-se, e a carapaça de tartaruga aos poucos, em pequeninos milímetros de cada vez, até todo o tecto baixar, e tu, desapareceres, em corrida, dentro de água com o cheiro a saudade, com o silêncio dos cobertores suspensos nas pálpebras tuas, que dormias, sossegadamente como um anjo louco, de caligrafia como pequenas mandíbulas de areia, como eu, desesperado procurando por ti, dentro de água, dentro de uma caixa de sapatos

onde funcionava uma pequena máquina de slides,

Com refrigeração,

a fundir lâmpadas desde1983,

E tubos de néons sobre a porta de entrada, “sabia-te quando terminavas nos sonhos e caminhavas no corredor da saudade, ouvia-te dançar sobre o mosaico porcelana da piscina em forma de rua, perdida, tu, corrias em direcção às escadas de acesso da rua dos pequenos beijos de porcelana, dormias entretanto, profundamente, pensava eu, quando olhava nos teu olhos cerrados as imagens reflectidas de uma louca e antiga máquina de slides, o picotado desenhado numa fina película de plástico retirada a um saco incolor de supermercado”, e uma campainha de serviço, um gajo feio, como eu, devidamente fardado a preencher os impressos para a atribuição de subsídios para a construção de máquinas de slides, e eles

apenas com uma caixa de sapatos, uma lâmpada, duas pilhas de volte e meio, alguns fios eléctricos, um pedaço de vidro que fazia de lente, e cerca de cinquenta centímetros de plástico com cerca de seis centímetros de largura, e um carrinho de linhas, e claro, a manivela em arame... e um pedaço de pano que apelidamos de lençol,

Com refrigeração?

e desenhos pacientemente desenhados com uma agulha,

A fundir lâmpadas desde1983,

pacientemente eu, a perder parafusos desde Janeiro de 1966.

 

(não revisto; parte deste texto não é de ficção e aconteceu com o meu amigo de infância - infelizmente já falecido - JÚLIO)

@Francisco Luís Fontinha


28.04.13

foto: A&M ART and Photos

 

Há fogo nos teus olhos minguados pelo silêncio da chuva

quando o meio-dia de um suicidado relógio

cai sobre as pequenas lágrimas de granito

como se os amargos poemas da morte

tivessem vida e começassem a transpirar sílabas furtivas,

 

Há fogo nos teus olhos

como janelas cristais dentro de hipercubos

como lábios de areia

da lareira dos sonhos

as tristes paisagens dos teus seios de amêndoa,

 

Há tanta coisa dentro de ti

meu cansado amor sem teres a destemida coragem de me olhar

escrever ou pintar no muro recheado de ervas e sanzalas imaginárias

os poucos sonhos que as minhas mãos deixaram no teu rosto argamassado

pelas geadas marés do vidro em planícies embalsamadas pelo desejo da paixão,

 

Há fogo nos teus olhos minguados pelo... da chuva

que te esqueces das poucas palavras que ainda vivem dentro de mim

como uma roseira bravia e ensanguentada pelas nuvens em demanda...

há meu amor

madrugadas fingidas em noites acordadas tuas fantasias,

 

E que não sabias

que há árvores à nossa espera num jardim invisível

onde passa um rio em corridas apressadas

adormece no mar

do fogo teus olhos minguados pelo silêncio da chuva.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha


27.04.13

foto: A&M ART and Photos

 

Haverá mares suficientes para eu me esconder, sendo eu, um barco sem motor, com uma velha vela, sempre, e sempre, à espera, à espera que acorde o vento, à espera que acorde o meu corpo de aço, me levante, abra a janela da maré, e oiça o teu coração,

e falta-me a coragem para dizer que te amo, alga silenciosa dos rios amordaçados,

Haverá assim ventos suficientes para te trazerem até mim? E se tu nunca apareceres, e se tu, não sei, se tu uma rocha que vive no fundo do mar, como saberás, eu não sei nadar, e se mergulhar, certamente, e pelas leis da física, jamais voltarei a olhar a luz nocturna das ruas de Lisboa, pensar que dos néons há galerias de arte que esperam visitantes, e há caves a transbordar de suor, e há sótãos a apodrecer, sobre a cidade, quando regressa o vento, quando tu desapareces para posteriormente, ao outro dia, ver-te sentada numa esplanada, como se não me conhecesses, como se nunca tivéssemos dormido juntos, inventando sonhos juntos, desenhando desenhos, não juntos, porque tu, apenas me olhavas embrulhados nos pincéis e nas tintas e nas telas e nas minhas loucuras, sempre eternas, sempre desérticas, como as Primaveras, como as dália e as margaridas, sobre a terra, à espera pelo regresso do vento, de vela pronta

zarpar,

Prometer, imaginar ser amado dentro de um cubo de vidro, apaixonado, eu, um barco sonolento, de aço, envergonhado, não adianta semear flores numa laje de cimento. não adianta escrever, ler, não adianta amar fingindo viver, não adianta caminhar,

não adianta fingir ser feliz quando somos a pessoa mais infeliz do universos, não adianta, não adianta mentir fingindo que estamos bem, quando todos os caminhos, todos os rios, e todas as luzes morreram numa noite de insónia,

Não adianta acreditar, sonhar, não adianta ter esperança...

Também tenho o direito de gritar e parar de fingir que está tudo bem,

“tão triste eu quando acorda a noite e cresce e cresce sobre as angustias do jardim um deus louco com uma perna de pau, tão triste eu quando as tuas mãos ausentes percorrem o meu corpo sitiado entre grades imaginárias de aço inoxidável e fios de seda e terminam viagem nas minhas mamas; primeiro regressa a noite,

depois ausentas-te juntamente com a noite e voas de árvore em árvore até mergulhares nos uivos dos meus olhos castanhos, depois, tão triste eu quando acorda a noite, depois a tempestade suspensa no corredor, passas apressadamente e não me olhas, depois, depois caiem todas as nuvens sobre este mísero divã e do relógio depois, depois as minhas mãos começam a envelhecer, a envelhecer depois o cortinado, a janela sem vidros, a envelhecer este quarto de pensão enfeitado de área de serviço, depois o relógio tomba silenciosamente no pavimento e morre o tempo,

tão triste eu. Acorda o chocolate na minha boca e imagino-te sentado no divã a fingires que do outro lado da rua vive um rio com barcos, que do outro lado da rua, tão triste eu, do outro lado da rua...

tão triste eu Meu Amor ausentada de ti.”

E conheci uma rosa que roubei do jardim numa noite de Agosto inventado num livro que poisava na mão de uma menina, os silêncios da noite ausentes de estrelas e alecrim, havia no ar o perfume do desejo, havia o perfume da noite submerso na paixão da literatura e da poesia, eu e a menina morremos, inventados no livro onde envelheceu a rosa e ainda hoje habita, tristemente só, tristemente inventada das palavras escritas apressadamente antes de acordar a noite,

não adianta acreditar, sonhar, não adianta ter esperança...

Não acredito em reencontros porque quando se perde alguma coisa é para sempre ou então, ou então essa coisa não foi perdida,

se eu escrever numa folha de papel e a amarrotar e a esconder dentro de uma gaveta, um dia, mais tarde poderei reencontrar esse manuscrito,

Mas se optar por a rasgar e destruir o reencontro será impossível,

“Poema em cio”

 

Desesperadamente

as minhas palavras

coladas no vidro da morte

em pedacinhos amargos

a boca do poema

em cio

mergulha ele dentro do silêncio

no desejo dos barcos entre as estrelas de papel

e a noite de fingir

assisto ao fim da noite

quando das vaginais madrugadas

ouvem-se os uivos das acácias em flor

 

desesperadamente

as minhas palavras

nos meus pequenos desejos de silêncio amargo

caminhar dentro do mar

antes de acordar o pôr-do-sol

 

dos vidros da morte

as minhas mãos em crustáceos de glicerina

os cogumelos da vaidade em sombras sibilas

e a laranja do amor

aos poemas loucos

as migalhas do aço inoxidável

nos olhos do deus do cio

desesperadamente

 

(Desesperadamente

as minhas palavras

coladas no vidro da morte)

 

e a morte vive no meu corpo

desde o dia que acordei poema em cio

e todas as janelas da poesia não tinham visibilidade para o mar

e todos os barcos

e todos os barcos ouviam-se dentro das estrelas de papel...



Percebes agora porque haverá sempre mares suficientes para eu me esconder, sendo eu, um barco sem motor, com uma velha vela, sempre, e sempre, à espera, à espera que acorde o vento, à espera que acorde o meu corpo de aço, me levante, abra a janela da maré, e oiça o teu coração... e depois

dir-te-ei que te amo loucamente, sem medo, sem medo de perder.

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

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