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Francisco Luís Fontinha

Blog do poeta e artista plástico Francisco Luís Fontinha.

Francisco Luís Fontinha

Blog do poeta e artista plástico Francisco Luís Fontinha.


07.12.13

foto de: A&M ART and Photos

 

um dia perceberás os quês

e os porquês...

… os porquês das minhas correntes de aço

e os quês...

os quês das minhas tristes mãos de papel celofane

um dia saberás que todas estas palavras nunca existiram

que eu não existo e sou apenas uma invisível mulher filha da madrugada

um dia

quem sabe

perceberás os meus quês e os teus

dela

porquês das sílabas tontas quando embriagadas nas nocturnas viagens ao infinito

um dia saberás que fui sempre um covarde de merda

correndo aprisionado a um maldito barco enferrujado

um gajo doido... que sonha com telhados em zinco

(vê tu meu amor... telhados em zinco)

palhotas

mangueiras

bananeiras...

pai... o que são machimbombos?

isso não existe

porquês

os quês

como borboletas nas tuas calças de tecido engomado...

saíamos das cabeças com cobertura de chocolate

tínhamos os dedos entrelaçados

e os quês

porquês

não sabiam

nós não sabíamos que os homens eram em granito

e os olhos construídos de sombras tempestades de aveia

aveia, pai?

querias tu escrever... areia

quero eu escrever

meu filho

aveia... aveia límpida em sexos murchos depois do cacimbo abalar...

um dia perceberás os quês

e os porquês...

e o que faço eu aqui

esperando o teu insípido regresso

os quês

e o amanhecer dos teus porquês...

um dia perceberás que as nuvens são de algodão

e as nádegas

nádegas, pai?

não, não meu filho...

que os livros são de palavras loucas

que procuram loucas bocas e apaixonados lábios...

(eu um homem em fuga

da paixão

do regresso dos quês...

e dos quês... dos porquês...

eu

um homem apaixonado com medo dele

ele... o covarde de merda

de pedra e com olhos de sombras tempestades de aveia)

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 7 de Dezembro de 2013


03.05.13

foto: A&M ART and Photos

 

Havia sílabas com fome, na tua mão de escritor, havia lábios em desejo, nos teus lábios em desejo, na tua boca de poeta, fingidor, havia sonhos, havia traços, círculos, rectas, não rectas, pontos, negros, nas tuas costas de tela voadora, verdejante, cintilante, como a língua do impostor, que mente, e não percebe que o teu esqueleto pertence às gaivotas mergulhadas no cio granítico de um rio em desespero, morto, cansado de amar, cansado de correr

para o mar, eu, quase morto, eu o pintor louco dentro de quatro paredes e um tecto falso, falsas palavras, falsas promessas, amanhã, e ontem, ou

De caminhar entre escombros, entulho, sexos murchos que a cidade inventa todas as tardes, depois do lanche, depois de o dia terminar, partir para a montanha dos insectos com dentes de marfim, encolhia-me dentro das tuas coxas, acendia a vela da esperança, e esperava, esperava, esperava...

ou

Esperava,

até que o poeta ficou desempregado, e hoje tratam-no como lixo, escumalha, até que o escritor deixou de comer as palavras escritas, por ele, por outros, o médio

Tem de deixar de comer imediatamente palavras, percebeu senhor Francisco? Pois que sim, respondi-lhe eu, e pensei – que raio de coisa ou coisas, vou comer a partir de hoje - “merda?”, e esperava, quando sentia dentro do meu peito uma rua em crescimento, sentia-a rasgar-se entre os esponjosos pulmões de areia fina branca do Mussulo, sentia o romper da madrugada, o apito da fabrica para o inicio do trabalho, os operários de bulldozer na mão rompiam-se-me corpo adentro, e eu, sentia-os, todos, sem excepções, sem locuções ou metáforas, sem mentiras, sem noites mal dormidas ou com recurso a drageias coloridas,

ou

E esperava, e hoje, quem sou? Nada, ninguém, sou um pedacinho de terra húmida que trouxeram de Luanda depois de uma longa tarde de chuva, e o tempo, desejo-o, o tempo que esqueci, que me esqueceu, perdi, e perdeu-me

sinto-a a crescer, já tem pavimento, começam a construir os primeiro edifícios de vidro, com telhados de vidros, com varandas com acesso ao mar, com árvores, com corações de açúcar, com orgasmos vínicos, e o sémen escuro, deleitoso da lama... sobre mim, em mim, uma rua, pronta a circular, e por engano, vão chamar-lhe

Ou, ele esperava, claro que esperava,

rua, rua, rua,

“Havia sílabas com fome, na tua mão de escritor, havia lábios em desejo, nos teus lábios em desejo, na tua boca de poeta, fingidor, havia sonhos, havia traços, círculos, rectas, não rectas, pontos, negros, nas tuas costas de tela voadora, verdejante, cintilante, como a língua do impostor, que mente, e não percebe que”, rua, chamar-se-á “rua dos ínfimos delírios”, sobre mim, sobre ti, dentro de nós, os sons, as palavras, as vozes

voz?

a tua voz, em minhas sílabas palavras, melódicas e às vezes com recheio de neblina, cacimbo, com o cheiro do lindo musseque, vazio, doentio, chovia, e eu, eu brincava dentro da lama lenta e liberta, em perfeita liberdade, cantava, eu, subia às mangueiras, e não, nunca tive medo de cair, e se eu caísse... a terra dos jardins de capim apanhar-me-iam como se eu fosse uma leve pena de enxofre, mórbida, miliciana, amena, o morro das Barrocas, e eu aqui, si, dó, e ré... deitado a imaginar gajas vestidas com panos de chita e de bandoletes em porcelana na cabeça,

Ou, ele esperava, claro que esperava,

rua, rua, rua,

“Cuidado com os cães”

rua, rua, rua

Rua “dos ínfimos delírios”, número trezentos e trinta e três, segundo andar – direito, algures pelo País, Portugal,

rua, rua, rua...

CUIDADO COM OS CÃES RAIVOSOS.

 

(ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha


18.12.12


Há dentro de ti
um fluido hidráulico que corre como um rio
alimenta os teus braços
as tuas pernas
os teus ossos engomados
pela complexa geada da noite

tens luzes na tua boca silenciosa
que esconde madrugadas
flores amassadas
incêndios de esperma
janelas encerradas
que não te deixam ver o mar

há dentro de ti
um jardim de terra queimada
capim
mangueiras cobertas de sonhos
e de papagaios de papel
há em ti a literatura verdejante que as mãos do diabo despenharam contra os rochedos da lua

há um homem cego
dentro de ti que habita a paixão
capim
zinco que rodeia a cidade
há uma canção
à espera da tua voz poética e que a chuva miudinha mastiga

e sofre
e engole
manhãs de ti dentro do perfume da maré
caiem docemente as partículas do sono
sem fé
que os teus lábios consomem na lareira do ciúme inventado por um louco

e pouco
muito pouco posso escrever dentro de ti
a não ser
olhar-te como um rio
que corre
e caminha o teu fluido hidráulico que traz a insónia em pedacinhos de cereja...

(poema não revisto)

@Francisco Luís Fontinha
Alijó


10.02.12

Abraço-me à solidão dos cigarros
E dou-me conta das mangueiras
Poisadas nos meus braços
Cansados
Sem forças para acender a noite
Sem forças para folhear um livro de poemas

(conheço a solidão provocada
Sei que existe a solidão desejada
E cresce em mim a solidão
Nem provocada nem desejada
Cresce em mim a solidão dos cigarros)

Sem forças para folhear um livro de poemas
E dou-me conta das mangueiras
Tombadas no pavimento com cheiro a cacimbo
E sorrisos de criança

Abraço-me à solidão dos cigarros
E dou-me conta das mangueiras
Poisadas nos meus braços

E dou-me conta que não tenho braços
E que os livros de poemas arderam
Na sombra das mangueiras
E jazem na garganta do mar

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