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Olho este desenho,
Olho-o como se fosse um filho que não tenho,
Olho-o e não percebo de onde vêm estes traços,
Malditos às vezes,
Que ninguém percebe, como eu,
Mas eles são filhos da minha mão,
Portanto,
Meus filhos são.
Olho-os, depois,
Depois começam a acordar as palavras,
Tal como os traços,
Malditas também,
Às vezes,
São tantas as palavras,
Que aproveito meia-dúzia delas…
E as restantes,
Lanço-as ao mar,
Escondo-as.
Olho este desenho,
E sinceramente,
Não vejo nada,
E o pouco que vejo,
Vejo um tolo, um tolo que vai à janela,
E fica a olhar a piquena a comer chocolates,
O Esteves em volta do seu cigarro…
E eu,
E eu e o senhor Álvaro de Campos…
A olharmos para a Tabacaria.
Depois vou ao mar,
Retiro as palavras que tinha escondido…
E escrevo,
E escrevo parvoíces…
Tais como os desenhos que faço…
E feliz eu, que sou filho de Deus, feito à sua imagem…
Se não o fosse,
O Pacheco diria, (Estás fodido, pá).
Já o nosso saudoso João César Monteiro…
Bem…
(Quero que as más-línguas se fodam, que se fodam).
E eu,
E eu aqui a olhar para este pobre desenho,
Só,
E ausente…
Que acabou agora mesmo de nascer,
Que não lhe vou dar um nome,
Ninguém deveria ter um nome,
E mais uma vez,
Olho-o, olho-os,
E nada,
Não vejo nada,
Nem ninguém.
O Pacheco que ainda não está contente,
(Puta que os pariu),
E daqui a pouco é o pôr-do-sol,
Regressa a noite,
A noite tem estrelas,
As estrelas são lindas,
E a vaca,
A vaca não dá leite.
E mesmo depois de eu morrer,
Estes desenhos andarão por aí,
Por algures por aí…
Alguns prisoneiros de uma parede,
Outros acabarão numa fogueira…
E a maioria…
No cu de alguém.
(Olho este desenho,
Olho-o como se fosse um filho que não tenho,
Olho-o e não percebo de onde vêm estes traços,
Malditos às vezes,
Que ninguém percebe, como eu,
Mas eles são filhos da minha mão,
Portanto,
Meus filhos são).
E se são ou não o são só a mãe o saberá,
Neste caso,
A minha mão.
E ela diz-me que sim,
Olha, não vês pelos olhinhos!
Claro que sim,
Vejo pelos olhos e oiço pelos ouvidos…
Se assim não fosse,
Também eu seria um traço,
E um dia,
Acabaria no cu de alguém.
Alijó 20/07/2023
Francisco Luís Fontinha