26.07.22
Tínhamos duzentas mil palavras sem razão
E uma espingardada de desejo,
Tínhamos a voz incendiada da madrugada
No cortinado beijo,
Tínhamos na mão a triste enxada
No grito de uma canção,
Tínhamos o silenciado
Cansaço dos socalcos ao Douro mergulhado,
Tínhamos a luz em demanda tristeza
Correndo montanha abaixo,
Tínhamos o rio crucificado
Na paisagem beleza,
Da paisagem alimento.
Tínhamos a uva invisível amanhecer
Que entre mãos emagrecia,
Tínhamos as palavras de escrever,
Tínhamos a alegria…
Tínhamos duzentas mil palavras sem razão
Nos seios teu maldizer,
Tínhamos poesia,
Tínhamos as flores em papel cremado
Nas cinzas que ele sentia…
Tínhamos as duzentas mil palavras de viver,
No viver encarcerado,
Do viver adormecido.
Tínhamos o vinho lunar
No poema desamado,
Tínhamos no corpo escondido
A lâmina triste mar…
Deste vinho embriagado.
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 26/07/2022