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francisco luís fontinha

Nunca vi o mar, A minha mãe sonâmbula nas noites de cacimbo desenhava o mar no teto da alcofa, um círculo com olhos verdes e sorrisos e cheiros que aprendi a distinguir antes de adormecer, e eu, e eu... francisco luís fontinha.

francisco luís fontinha

Nunca vi o mar, A minha mãe sonâmbula nas noites de cacimbo desenhava o mar no teto da alcofa, um círculo com olhos verdes e sorrisos e cheiros que aprendi a distinguir antes de adormecer, e eu, e eu... francisco luís fontinha.


09.04.23

Habitamos dentro deste labirinto

Frio e escuro

Onde desenhamos no corpo o desejo

Quando escrevemos no corpo

Cada silêncio que a noite alicerça sobre o mar,

 

Habitamos dentro deste labirinto

Sem janelas

Com portas e frestas

Quando chega a nós

A louca Primavera,

 

Quando regressam a nós

Os gladíolos de uma noite em tórrida paixão

E quando dos teus doces beijos

A tua mão distrai-se na minha boca

Insígnia da madrugada,

 

E podia terminar a noite

E recomeçar outra noite

Habitamos dentro deste labirinto de noites

Que apenas o prazer e o silêncio

Sabem fotografar depois do luar adormecer,

 

E dos teus olhos

Quando acordam as primeiras lágrimas da manhã

E num sorriso de luz

Uma criança te oferece a flor mais bela que o silêncio pode cultivar;

A flor da liberdade. A flor de amar.

 

 

 

Alijó, 09/04/2023

Francisco Luís Fontinha


29.01.23

No sorriso de uma criança

Cresce uma flor imaginária,

Invisível como a lua em dias de silêncio,

Que conta estórias em pedacinhos de mar…

 

Do sorriso de uma criança,

De todas as crianças,

Acorda o sol desenhado por Deus,

 

No sorriso de uma criança,

Brincam as manhãs…

Todas as manhãs,

Que uma criança,

Transporta no olhar.

 

 

 

 

Alijó, 29/01/2023

Francisco Luís Fontinha


15.10.22

Poema – fotografia com palavras. Morreu de saudade, o poeta pega no bisturi da paixão e disseca a manhã que acaba de acordar. Dos lábios, em pequeno jeito, retira todos os beijos e poisa-os cuidadosamente sobre o papel amarrotado que o luar trouxe até à sua mão.

Depois de radiografar todas as sílabas, retiradas todas as vírgulas e pontos finais, o poeta, pega nos tristes parêntesis e coloca-os, não sobre o papel amarrotados, mas sim sobre a secretária onde dormem os livros Lobo Antunes, AL Berto, Pacheco, Cesariny, Cruzeiro Seixas e de um tal Fontinha, mas quanto a este último, como dizem que é um pouco louco, o narrador nunca tem a certeza se os livros deste, quatro e milhares de publicações no blog Cachimbo de Água, ainda jazem na dita secretária; um dia estão aqui, no outro, ali, e às vezes, por aí.

O bisturi da paixão entre traços pincelados de silêncio e sombras de desejo, em pequenas quadrículas, começa por dissociar os lindos olhos da manhã que acaba de acordar das pestanas cinzentas da neblina em fuga; dos olhos, o poeta, retira as imagens de um qualquer luar que uma qualquer noite poisou sobre o mar, porque há sempre um rio que corre para o mar, uma ribeira que correr para um rio, e claro, há sempre um corpo no bisturi do poeta.

O sorriso da manhã que acaba de acordar, agora já separado dos lábios, e acreditando que o poeta segue todos os procedimentos de uma dissecação, suspende-se na janela do sonho, que por enquanto, ainda pertence ao poema. E neste momento, o poeta ainda não sabe que este sorriso lhe pertence.

Nos seios, o bisturi da paixão, em pequenas incisões, deixa sobre eles a última vontade do poeta, e o poeta, sem dar-se conta, transporta na mão pequenos pedacinhos de saliva que sobejaram do beijo anteriormente retirado; somos instantes, pensou ele.

Mas nem só de seios é constituída a manhã que acaba de acordar, e continuando a dissecação do poema, o poeta dissecador, num movimento de dezoito graus Norte, coloca o olhar nas coxas silenciadas pela alvorada, enquanto as estrelas, em pernoitada conferencia, tentam chegar a consenso; dormir ou azucrinar a paciência ao poeta. Por unanimidade, resolvem azucrinar a paciência do dito.

Dito isto, o bisturi da paixão separa as pequenas gotículas de prazer alicerçadas à pele lisa e desejada que cobrem a manhã que acaba de acordar e num ápice, como se acabasse de desenhar um silenciado orgasmo no distante luar que acabou de acordar, conta-as, cataloga-as, e depois coloca-as dentro de um pequeno frasco onde já existiam três pedacinhos de sémen, uma madrugada que se tinha suicidado junto ao mar, e claro, o rio que tinha fugido da montanha.

O poema deixou de pertencer ao poeta e é imagem desassossegada do dissecador que um dia dirá que

Fui muito feliz sobre esta pedra cinzenta.

Ou, existirá sempre um pedacinho de mel nos lábios da manhã.

E como o poema é uma fotografia com palavras, onde um corpo vacila sobre a ponte que apenas o sonho consegue pintar nas nuvens cinzentas que às vezes poisam sobre o poeta, há um sorriso que aos poucos se abraça a esta pequena fotografia e há palavras que partem e nunca mais regressam. E há silêncios que se tocam sem perceberem que a paixão, depois de descartado o bisturi, pois já não é necessário, se transformam em desejo, depois em uno corpo crucificado na maré dos sonhos envenenados.

Quando perguntam ao poeta o que pensa da manhã que acaba de acordar e qual o resultado da dissecação, este é sorrisos amortecidos, responde que… não penso nada e quanto à dissecação:

Depois de dissecado o poema e analisado, concluo que o dito morreu de saudade.

 

Saudade – quando no mar desenhado na alcofa de uma madrugada de cacimbo, sons de um pequeno rádio a pilhas dança sobre os olhos verdes de um miúdo em soluços depois de perceber que do tecto caem pedacinhos de geada.

E quando o paquete do regresso entra Tejo adentro, o miúdo da alcofa vê sentado junto à Torre de Belém um rapaz tímido, abraçado ao medo, que numa das mãos tem um livro e na outra cigarros que o acompanharão até aos dias de hoje.

O barco aos poucos aproxima-se da cidade, e o miúdo com a alegria de um miúdo que acaba de acordar, sorri

Pai, um machimbombo!

Autocarro, filho. Autocarro.

Desde então, nunca mais consegui assassinar a saudade.

E já agora, caro leitor, qual será a pena para um assassino em série de saudades?

A saudade vai. A saudade vem.

O tempo passa.

Os machimbombos agora são autocarros, e um amigo segreda-me que por eu ter nascido em Luanda, sou Calcinha.

Autocarro, filho. Autocarro.

 

O poema é uma fotografia com palavras. O poema é a imagem que apenas o desejo consegue desenhar num corpo em fúria. O poema é silêncio. O poema é paixão. O poema é tudo e não é nada. O poema é um pedacinho de mel. O poema é um pedacinho de mar. O poema és tu, manhã que acaba de acordar.

 

 

Alijó, 15/10/2022

Francisco Luís Fontinha


08.10.22

Eramos muitos. Eramos loucos. Amávamos muito… hoje, somos pequenos pedacinhos de tecido suspensos nas nuvens da manhã, dos livros às cores garridas abraçadas ao branco tela, de um banco de jardim até aos longínquos passeios junto ao mar, e acabávamos sempre a noite a falar de Dostoevsky, o que provavelmente seria melhor do que falar de plantas ainda não nascidas,

A lareira erguia-se na cozinha desarrumada e aos poucos, poemas, desenhos, começaram a alimentar as lágrimas da mesma, ele, sorria de tanta felicidade; finalmente tudo o que saía dele começava a fazer sentido,

Sorriam as cinzas à janela do silêncio,

Eramos muitos,

E não sabíamos que das grandes árvores do destino, que o acompanham desde menino, um dia transportassem os cadáveres que hoje habitam nas manhãs de sábado, nas manhãs de segunda-feira, nas manhãs de quinta-feira, e mesmo assim, ainda existem algumas limalhas de aço que deixaram de responder aos apelos de uma nova vida,

Começamos então a semear as cinzas sobejantes nas tardes junto ao mar,

Eramos muitos. Somos quase nenhuns,

Amávamos muito… hoje, pertencemos aos esquisitos, não alimentados pela escura noite que nos abraça em cada pequeno silêncio, e as lâminas do desejo, hoje, são apenas lâminas do desejo. Nos livros, encontrávamos as margens pequeninas de um rio, rio que hoje é apenas saudade, e dos livros, sentíamos as poucas alegrias que a madrugada nos proporcionava,

Agora mesmo,

Sentimos o corpo desfalecer, somos instantes dentro de um túnel infinitamente louco e apaixonado, e quanto às cinzas dos poemas, dos desenhos, dos tristes silêncios que apenas a noite nos trazia, hoje parecem pontos de luz em busca da eternidade,

Movimentam-se dentro de nós,

Todas as estrelas do universo, e de infinito em infinito, há sempre uma recta à nossa espera, está cansada, grávida e infeliz,

O menino dos calções cresceu, vive dentro dos livros de Dostoevsky, o menino dos calções deixou de passear junto ao mar, porque o mar, como outros mares, morreram junto aos rochedos da infância,

Uma lágrima solta-se do sorriso do sol, então porque crescem as acácias neste jardim despovoado de meninos?

E choram?

Como choram todas as manhãs as minhas fotografias ao saberem que os poemas, os desenhos,

Cinzas.

E não sabíamos que um dia regressaria o sono, e não sabíamos que um dia se esconderia o sol e a lua, mas sabíamos que das cinzas dos poemas e dos desenhos… eramos muitos, eramos loucos, e amávamos muito, e não sabíamos que de um lindo dia de Primavera nasceriam as pedras cinzentas onde nos sentamos ao acordar.

E choram?

São cinzas, menino…

Cinzas das suas estórias, porque acabávamos sempre a falar de Dostoevsky, como sempre, sentados num banco de jardim, à espera de que a noite nos levasse,

E levou-os,

Hoje, somos instantes, somos poucos à mesa, e desconhecemos se o infinito existe. Hoje já não somos os meninos que passeavam junto ao mar, porque o mar morreu, porque o mar sou eu, porque o mar já não é o mar,

Então, decidimos subir a montanha,

Das cinzas, os beijos,

Nas cinzas, as lágrimas do poeta,

Cinzas, menino, cinzas.

E mesmo assim, sabíamos que as gaivotas, como todos nós, eram apenas instantes dentro de um cubo de vido com fotografia para o Outono; cinzas, menino. Cinzas de crocodilo…

Até que o mar voou da pequena alcofa levando o pequeno sorriso.

Cinzas, menino.

Cinzas de crocodilo.

 

 

 

Alijó, 08/10/2022

Francisco Luís Fontinha


14.02.20

Uma rosa,

Rosa,

Rosa,

No teu corpo,

Corpo,

Corpo, rosa.

Um sorriso,

Riso,

Palavras,

Lavra,

No poema,

Ema,

Riso,

Rosa,

Cama.

Um silêncio,

Lêncio,

Algures na madrugada,

Ugada,

Ada…

Uma pedra,

Pedra,

Nas palavras,

Lavras,

Quando acorda a noite,

Noite,

Oite…

Uma rosa,

Rosa,

No amor,

Rosa,

Mor,

Flor,

Lor,

Dor.

Uma pirâmide de giz,

Na ardósia nocturna da serpente,

Mente,

Ente.

Do ponto,

Onto,

Nada.

Nada, de mim.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

14/02/2020

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